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O Terrorista Gustavo
Na praça rolava uma lata de Coca-Cola,A sessão é solene
A sessão é solene.
As gravatas escrupulosamente alinhadas formam filas de interesse.
O ambiente, sentado, é de compenetração.
Entra o leitor.
A agitação que tremeu as cadeiras é breve.
Os últimos acertos de posição, a escala monocromática do pigarreio da responsabilidade, a agitação sonora dos nós de gravata solidários.
Começou, pelo título.
"Há moscas em torno da lâmpada"
Algumas nucas nas costas, distraídas.
Isto era o título.
Começou.
A cadência é cadente, o tom de arranque.
Interesse expectante.
Frases vagam de encontro às cadeiras com costas importantes.
Cada palavra é um molhe de significados díspares, plena de interpretações.
O virar de página tem, também, o peso da palavra.
Novo arranque, esforços recomeçados de atenção.
Com o ritmo ordenado de uma curva gaussiana a perna direita sobrepõe-se à outra, alternando assim.
O som suave susurrado pelo tecido vai indiciando o nível económico da sessão.
E a mosca que bate mesmo na lâmpada prende já ao filamento expressões embaladas na cadência cadente da sala.
A mosca em torno da lâmpada tem a frenética vontade de entrar de quem ficou de for a. Presa na sala, do lado de for a do vidro.
Presos na sala, fixos na mosca, o poema ganha sentido.
Virar síncrono de algumas cabeças - um pigarro ecoou.
(Qual a última palavra do leitor?)
Torcer milimesicamente conjunto dos pescoços - o metal da cadeira rangeu.
(Qual a última palavra do leitor?)
"A importância momentânea do mais ínfimo"
A claridade na sala é mais brilhante, solta, já não presa por muitas retinas.
A momentos de quanto mais calma, seguem-se momentos de quanto mais agitação.
Ao celeste ressonar a maléfica cotovelada.
Pausa grave do leitor.
Silêncio de moscas, comprometido.
O arranque final, poderoso, despertador.
A outra sobre a direita.
"Massificação!".
Terminou?
Terminou.
Trovejar de tempestade de Verão, na sala.
Súbito, forte.
A mosca perde-se da lâmpada.
As cadeiras mexem-se aliviadas, agitam-se de liberdade.
Mas.
A mão no ar do leitor de pé atraiçoa o hábito instituído.
Silêncio.
Com todas as desculpas devidamente discriminadas, duas páginas do livro que tinham ficado coladas.
A bem do significado, do autor, da poesia e da arte no seu geral, a releitura impõe-se.
Unanimidade concordante.
O releitor senta-se.
Recomeça, pelo título.
"Há moscas em torno da lâmpada"
São duas.
E todos prestam atenção.
© Mário Montenegro / Julho 2000
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